Transporte coletivo urbano e o cadeirante

Assistindo uma apresentação de um produto dedicado a pessoas deficientes, dependentes de cadeiras de rodas, participamos de uma discussão sobre o direito que todos têm à segurança. Se a incolumidade patrimonial dos cidadãos é importante, a garantia de que serão respeitados em suas necessidades que denominamos “acessibilidade”, termo de senso comum entre aqueles que se dedicam a essa causa, é algo mais do que sagrado, justo, mas infelizmente desprezado pelos gestores públicos.
O representante da empresa que mostrava seus produtos justificava, entre outros argumentos, sobre o risco de grandes indenizações em caso de acidente. Nos EUA, na cidade de Los Angeles, 32 pessoas deficientes ganharam um e meio milhão de dólares, cada um, só no ano passado em demandas por indenização após acidentes dentro dos ônibus. E aqui? Quando muito teremos o calvário de ações que talvez se concluam após muitos anos, dando à pessoa lesada uma compensação irrisória sobre os prejuízos que sofreu.
Afinal o poder político das concessionárias é enorme. Podemos, contudo, perguntar: interessa às empresas dedicadas ao transporte coletivo prestar serviços ruins?
Infelizmente caímos na armadilha da menor tarifa possível. Obviamente que a camisa de força obriga a todos reduzir custos, maximizar ganhos.
No transporte coletivo urbano ganha-se aumentando o número de passageiros por viagem, aumentando-se a velocidade do sistema, reduzindo-se o tempo de embarque e desembarque, utilizando-se ônibus tão baratos quanto possível, pagando-se mal os seus funcionários etc. Qual é o efeito do cadeirante? A entrada e saída de um cadeirante significam alguns minutos a mais na viagem, mais custo sem a compensação tarifária. Quem paga?
O sistema de Curitiba foi planejado para tirar do empresário a preocupação com os resultados operacionais, será?
Na implementação de normas operacionais a prefeitura poderá neutralizar a visão do serviço social determinando tempos mínimos de viagem que os motoristas deverão cumprir. Se não existir comunicação entre o motorista e alguma central de operação, on line, não haverá como informar atrasos. Se não existir uma frota operando com folga, haverá pressão por excessos. Isso e muito mais está fazendo do transporte coletivo um sistema ruim, desagradável.
A cidade deveria subsidiar explicitamente o transporte coletivo urbano; cada centavo gasto em asfalto de ruas sem ônibus deveria ter uma contrapartida no sistema. Fórmulas e análises precisariam ser feitas para uma gerência eficaz. Quando? Como? Quem?
Se algo poderá envergonhar algum brasileiro que se digne a ver os sistemas de transporte coletivo urbano nas melhores cidades européias é a diferença de atenção para com as pessoas deficientes. Ônibus com piso rebaixado, limitadores de aceleração e desaceleração, suspensão pneumática ajustada para o embarque e desembarque, lay out adequado às pessoas deficientes, comunicação com os passageiros, limites de densidade, comunicação, segurança e outros recursos, talvez invisíveis ao turista alheio a questões técnicas, mas reais, funcionais, efetivas, tudo estimulando o uso do sistema, fazendo da viagem nesses ônibus algo aceitável, muito menos constrangedor e perigoso do que em nossa pátria amada.
O debate na ADFP foi sensacional (26 de janeiro de 2009), produtivo. Nossa esperança é a de que ele se amplie pela cidade, pelas entidades dedicadas a pessoas idosas, doentes, deficientes, crianças etc.
Podemos e devemos ter um transporte coletivo urbano à altura de sua fama, maior do que a merecida.

Cascaes
26.1.2009

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