Ócio mal criativo

Domenico de Masi, professor de Sociologia do Trabalho na Itália, escreveu muito sobre a importância do ócio, da possibilidade de se viver trabalhando menos. Ele e outros devem ter feito doutorado no Brasil, talvez entendendo mal o que existe em nossa terra. Nação que manteve a escravidão formal tanto quanto foi capaz de resistir à pressão internacional, criou uma lógica de existência estranha.
Somando-se à disposição para gastar tempos infinitos em carnavais e férias sobre férias, sofremos a influência da cultura do carimbo, dos sindicatos profissionais, conselhos de "defesa da profissão", cartórios, vistos, taxas, impostos e, para coroar tudo, uma lógica de administração financeira do Brasil simplesmente hedionda, criando-se um tremendo custo Brasil. Graças a isso somos campeões mundiais em juros e devemos disputar acirradamente a taça dos impostos diretos e indiretos.
Felizmente o Brasil é um país fantástico, capaz de produzir muito onde os índios, antropólogos, ONGs estrangeiras e nacionais de defensores de nossas florestas (não vale para aquelas que rodeiam nossas grandes cidades, como, por exemplo, a Floresta da Tijuca), IBAMA, FUNAI, movimentos de toda espécie não atrapalham. Em lugares que, enfim, não existam fiscais radicais de plantão defendendo leis, decretos, normas, portarias e caprichos dos nossos legisladores e chefes de plantão. Com tanta lei será difícil não infringir alguma.

Querem e parece que um dia viabilizarão o desmembramento do Brasil em uma dezena de nações. Temos regiões que gostam de trabalhar, amam a Justiça, desejam paz e segurança para produzir, viver. Em algum dia deixarão de aceitar o império de gente que entende ser natural sobreviver sem fazer nada além de filhos, rezas e festas. Outros lugares poderão existir do jeito que parece pretenderem.

Estamos em tempo de Imposto de Renda. As feras da Receita aprimoram sistemas de vigilância e cobrança. O Governo quer mais dinheiro, precisa, por exemplo, pagar suas viagens ao exterior onde não se cansa de dizer bobagens, que protocolarmente são aplaudidas. As despesas da cozinha e bares do Palácio da Alvorada mostram a seriedade administrativa. Acima de tudo, os juros exorbitantes que impõe, sob desculpa de conter uma inflação importada, demandam muito dinheiro, especialmente essas que esse tal de COPOM dá um jeito de explicar, mal e porcamente. Afinal, sinceramente, como e por quê não baixam os juros? Podemos dizer?

O macete é conquistar um lugar nos serviços públicos. Bons salários, garantias e até lei impedindo-nos de dizer “olho no olho” o que pensamos quando visitamos uma repartição pública. Não deveria existir mais uma lei defendendo o povo para equilibrar o império dos burocratas nesses balcões da vergonha?
Infelizmente o governo anunciou que protelará os concursos, precisa economizar de dinheiro para os agiotas. Ou seja, os serviços vão piorar e as oportunidades...

Temos greve de petroleiros (ganham pouco), índio chantageando empresa de energia, expulsão de arrozeiros (com certeza existe sobra de alimentos no mundo), quadrilhas festejando as facilidades de acesso aos hermanos cocaleiros e demagogos do norte e noroeste da América do Sul, um Congresso preparando mais leis (seria infinitamente melhor que as simplificassem, que as tornassem mais objetivas, que reduzissem impostos, que estabelecessem maior vigilância sobre o que fazem) etc.

Santa Catarina implodiu com as chuvas de novembro. Ganhamos explosões de gasoduto (feitos de que maneira?), desmanche de porto que não resistiu as águas que deveria dar passagem, fechamento de estradas mal feitas, inundação de lugares mal protegidos (drenagem?), avalanches mortais etc.. Em debate em Blumenau, imaginando que talvez tudo se devia à Lei 8666, que impõs editais e contratações e compras pelo menor preço, fomos ridicularizados por pessoas que conhecem os políticos locais.

Assim, a exemplo de SC, administradores de serviços públicos, sabendo-se protegidos, aqueles que decidem, acintosamente fazem o que bem entendem, ainda que tudo signifique a morte de centenas de pessoas e a perda de bilhões de reais à primeira tormenta. Vimos os acidentes do metrô de São Paulo, ponte caindo no Paraná, avião saindo da pista em Congonhas, atrasos incríveis em obras estratégicas e muito mais por efeitos ainda talvez sob investigação.

A incoerência não é apenas brasileira. A atual crise econômica, que agora enfrentamos, começou pela desonestidade de banqueiros e bancários (afinal são eles que operacionalizam as contas), operadores de Bolsa de Valores, funcionários venais de organizações de vigilância etc. estrangeiros.

Estávamos, Brasil, saindo de duas décadas perdidas por efeito de tempos anteriores de desgoverno, naquela época apelando para soluções mirabolantes tais como a correção monetária, proteção sem limites para “empresas brasileiras” (vide montadoras que nos impunham carros anacrônicos), congelamento de preços e, após o Plano Real, privatizações mal cheirosas, moeda supervalorizada, racionamento de energia porque o Presidente não sabia que iria faltar energia elétrica e por aí afora..
Congelamos, paramos o Brasil diversas vezes.

Isso é Brasil onde devemos viver e trabalhar, “ops”, trabalhar? Aqui ser empreendedor é crime e trabalhar é sinônimo de burrice. Aqueles que fazem algo são necessários, contudo, alguém precisa sustentar a malandragem, que nada tem de criativa, exceto para descobrir mais e mais formas de atrapalhar quem se preocupa realmente com esse país.

Cascaes
24.3.2009

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