Até quando?

Eu tinha um sonho
Nasci na década dos anos 40, 1944 para ser mais preciso, anos finais da Segunda Guerra Mundial.
Garoto nos anos 50 e jovem no tempo dos Beatles, vivi todos os sonhos possíveis ao sabor do jogo político nacional e internacional.
Eu tinha um sonho. Por imensa felicidade convivi até os 18 anos com meu pai. Ouvia com imenso prazer seus conselhos, discutia, discordava, mas aprendia que talvez existissem verdades, caminhos caminháveis.
Estudei no Colégio Santo Antônio. Frades franciscanos, não todos, alguns sonhavam e transmitiam esperanças. Para outros era mais fácil ensinar o medo, a disciplina, afinal a maioria era descendente de alemães que provavelmente lutaram na Primeira, na Segunda ou nas duas guerras, pelo lado alemão...
Tornei-me adulto vendo os efeitos da ditadura, sonhei com a redemocratização, assustei-me com a inflação. Cheguei ao que dizem ser a idade madura participando de ações políticas e profissionais, convivendo com políticos e executivos, peões e gente do povo, aprendendo com minha família, sofrendo e rindo com todos.
Cursinho em São Paulo, era o ano de 1963, período turbulento de nossa história, sempre entupida, usando a palavra mais adequada, de demagogos irresponsáveis. Cidade imensa fazia a gente sentir saudades das árvores do Vale do Itajaí.
1964, vestibular, faculdade, golpes e violência. Esquerdistas de araque fugindo do Brasil, outros mais sinceros querendo enfrentar as tropas. Castelo Branco, esperança até na alvura do nome. Caímos em mais uma ditadura...
Tínhamos sonhos, acreditávamos que o Brasil podia ser o contorno de uma nação séria, honesta, responsável.
Quantos morreram, de lado a lado, esquerda e direita, querendo construir uma pátria melhor. Os vigaristas voltaram, começaram a mandar sob fuzis, continuaram com seus sempre leais bajuladores, eleitores, gente ignorante e brasileiros devidamente instruídos para serem oportunistas, bajuladores, condôminos da sacanagem.
Acreditávamos na Humanidade, pensávamos que a Terra poderia ser povoada por seres infensos ao fanatismo religioso, ideológico, racial. A Segunda Guerra Mundial fora um evento tenebroso. Aos poucos aprendemos o que também poderia ser o império de ególatras, de líderes que sob bandeiras vermelhas, azuis ou brancas simplesmente disponham de multidões para massacrarem quem quisessem.
Sonhamos um sonho, acreditamos que a humanidade evoluiria, que os caudilhos, ditadores, líderes paranóicos e psicopatas eram coisa do passado. Imaginávamos que a democracia, educação, a cultura, a instrução fariam nações mais sérias, responsáveis. Não imaginávamos a possibilidade do retorno das teocracias, do fundamentalismo religioso, dos racismos e racialismos.
O pesadelo do genocídio, das restrições à liberdade, censura, dos padrões comportamentais definidos por senhores embaixadores de Deus e de classes privilegiadas deveriam terminar, recomeçam com força, apesar de tudo.
Temos esperança, contudo. Se Deus existe, Ele deve ter criado em nossos cérebros a chave da verdade, da coragem, da vontade de evoluir. Ainda podemos e devemos sonhar. É uma mensagem difícil para quem fez 65 anos. Afinal, a mediocridade, a omissão, a indiferença ao sofrimento humano é uma realidade. Até quando?

Cascaes
16.10.2009

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