CVs e Prontuários

Placas, prontuários e CVs
Andando por qualquer cidade é normal vermos, tirarmos fotografias e até lermos placas de bronze, pedra, porcelana etc. informando o nome daqueles que inauguraram chafarizes, estátuas, revitalizações, praças e por aí afora. É um privilégio político, concedido democraticamente, o chefe dos chefes aparecer nessas placas que, eventualmente, desviam a atenção dos verdadeiros responsáveis pelos enfeites e utilidades públicas.
A história tem muitos autores e atores, no palco da vida existem aqueles que desfilam suas artes, mas também uma coleção enorme de auxiliares e promotores, nem sempre lembrados dignamente.
A vida das nações é complexa, das grandes às menores encontramos talvez nas placas dos cemitérios registro de heróis, de personalidades esquecidas, afinal os nomes da maioria absoluta delas não ganharam a honra de se transformarem em denominação de ruas, praças e coisas assim. A maior parte dos muitos heróis e soldados desconhecidos esteve alijada do poder, desaparecendo, desta forma, das honrarias que se prestam aos grandes chefes.
Sabemos, também, que muitos possuem prontuários enormes, sabemos? Talvez não, aos poucos vai sobrando o que a sociedade quer lembrar. Comunidades novas, por exemplo, precisam construir heróis, paradigmas, ainda que muitas vezes com muito esforço esquecendo as desonestidades e violências daqueles que aos poucos se transformam em generais de bronze.
Fomos técnicos, cidadãos, somos gente, temos lembranças.
Como é bom descobrir que (e quando) não somos esquecidos pelo que fizemos de melhor. Se por força de muitas lutas envelhecemos mais cedo, perdemos habilidades e sentidos, ficamos ranzinzas, ainda acreditamos, com mais convicção sendo respeitados, talvez, que a luta valeu o sacrifício.
Felizmente vivemos a época da internet, dos blogs, das facilidades de registro. Assim cavoucamos escaninhos eletrônicos para dizer a quem se dispuser a ler, ver, ouvir o que orgulhosamente, de forma sutil ou acintosa, registramos de nossa história.
Dizem os especialistas em história das humanidades que o ser humano procura desesperadamente a eternidade. Assim ele se fez à imagem e semelhança de Deus em algumas religiões (quanta petulância), mandou fazer pirâmides, procurou embalsamadores, outros, nesses tempos modernos, se deixam mergulhar em tanques criogênicos antes que a hora final comece a desmanchar seus corpos.
Procuramos ser lembrados, de que jeito?
Inventaram padrões de registro. Agora temos os famosos CVs. Ótimo! Nada mais modesto do que isso ou, ao contrário, cheio de grandiloqüências. Somos bons nisso, fazemos isso, fizemos aquilo, vivemos aqui, trabalhamos ali. Num papel ou tela eletrônica dizemos, muitas vezes em desespero, na luta pela conquista de um lugar profissional, que somos, fomos, podemos, queremos, lutamos, construímos, temos etc. e com que orgulho aos poucos acrescentamos diplomas e eventos em nossos CVs...
Poderíamos ser obrigados a mostrar a contrapartida. Houve tempo em que o DOPs fazia isso. Sindicatos patronais talvez tenham suas “Listas Negras”, clubes praticam o jogo da “bola preta”, equipes de RH procuram, via entrevistas, descobrir o lado ruim da gente.
A vida é isso, ela passa e, meus amigos, como é bom chegar ao final podendo mostrar um CV de que nos orgulhamos, eventualmente até um prontuário feroz, mais gostoso e cheio de vida do que os CVs bem comportados que usamos para poder ganhar algum contrato ou salário.

Cascaes
17.12.2009

Comentários

  1. Certeza que muitos que tem seus nomes registrados em placas de bronze em nosso "Brasil varoníl", pelo histório da maioria de nossas lideranças políticas (pelo seus CVs me envergonham) sejam do executivo, legislativo -pincipalmente este- e do pouco que sabemos também do judiciário, muitos ao invés de dar nomes a ruas e praças, serem gavados em bronze, deveriam estar (ou terem ido) para a cadeia pública.
    Aldino
    19/12/2009

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