Democracia e os marqueteiros

A propaganda e a política
A democracia é nossa esperança de podermos viver de forma justa, livre, participativa e proativa em qualquer nação. A materialização do processo democrático é um tremendo desafio que se torna colossal em países de grandes dimensões. Condições históricas, tradições, ideologias e acima de tudo oportunismos criaram a classe dos políticos, gente que se dedica em tempo integral à arte de cativar votos e alianças para o exercício do poder.
Temos os partidos políticos que deveriam agregar eleitores em função de convicções ideológicas e comportamentais. Em povos mais desenvolvidos isso significa assumir posições bem definidas no espectro ideológico da nação. No Brasil já tivemos algo assim desde os tempos do Império, mais ainda, talvez, lembrando experiências pessoais, no espaço entre 1946 e 1964, quando ser udenista, trabalhista, pessedista, perrepista, comunista etc. significava muito. Podia-se adivinhar o partido de alguém simplesmente observando sua maneira de ser, o comportamento etc.
No período militar tivemos duas décadas de afastamento da lógica democrática. O medo do povo não fardado impedia organizações de caráter ideológico e a assunção de simpatias. Lideranças de esquerda fugiram ou se isolaram e a juventude daquela época perdeu a oportunidade de amadurecer nas lutas escolares, universitárias, nos espaços de protesto tão naturais em países livres e tolerantes. Pior ainda foi a perversão daqueles que fugiram, voltaram irreconhecíveis. Os ares europeus afetaram a maneira de ser de muitos deles, devolvendo-nos gente confusa, capaz de lógicas complicadas. O desmonte da União Soviética (desmonte material e moral), o realismo chinês e a descoberta da importância da liberdade deram-nos outras formas de compreensão da política. As siglas, contudo, permaneceram e agora, com bandeirinhas, estrelinhas, cores e uniformes enfeitam campanhas políticas; resta saber se coerentes com seus programas partidários, propostas ideológicas, metas e estratégias de luta que fizeram história no passado. Talvez em benefício da pacificação dos povos agora as religiões, ideologias, crenças e convicções deram espaço para desejos de consumo, de lazer, de prazer e satisfação de taras e sonhos mais simples.
O poder é um desses prazeres que empolgam. É interessante estudar, por exemplo, o perfil dos líderes mais radicais do nazismo alemão. Descrevem burocratas, pessoas aparentemente sensíveis e cultas que, entretanto, sentindo o cheiro de sangue se transformaram em chefes sádicos, mórbidos, satânicos. Eles todos tinham algo em comum, foram objeto de lavagem cerebral, de processos de propaganda constantes, intensivos.
A propaganda, o marketing político virou ciência. Qualquer militante que freqüente reuniões partidárias conhecerá algum, gente especialista em como mentir, aparecer, falar, vestir etc. Tenebrosamente praticamente todos, para dourar suas propostas de trabalho, em algum momento de suas “aulas” dizem que o povo é egoísta, não gosta de pensar, é ignorante, deseja ser enganado...
O marqueteiro cobra caro. Sugere gastos enormes em santinhos, programas de mídia, ajustes de imagem, pesquisas etc. De alguma forma implicitamente recomenda padrinhos, financiadores, dinheiro que não interessa a eles de onde vem, mas necessário à vitória nas urnas.
Notamos que, de fato, muitos de nossos expoentes políticos usam exaustivamente a mídia, a marquetologia, o dinheiro nosso, vosso, deles e de outros para propaganda. Os escândalos das meias e cuecas ilustram de forma vergonhosa a maneira que alguns trabalham. Outros, mais sofisticados, aproveitam roupas melhores e assessorias mais cautelosas e competentes.
De qualquer modo, graças a uma estrutura de ascensão política descobrimos que política é privilégio de abonados e clientes de grupos poderosos, não é assunto para cachorro pequeno.
Teremos eleições em 2010. Na esteira do processo de conquista do poder construímos já existe uma aristocracia, um time de sangue azul, e outros que fazem carreira, conhecem os escaninhos políticos e sabem usá-los.
Sejam quais forem as veredas para o Olimpo, a esperança é a de que alguns se destaquem, sejam eficazes, trabalhem a favor do povo, conduzam o Brasil a seu destino (existe?) de grande nação. Afinal, se perdermos as esperanças poderemos, assim, dolorosamente, desistir da liberdade, dignidade pessoal e voltarmos talvez para gaiolas com alpiste e uma tigela de água... Sempre é bom lembrar Sir Winston Churchill “A democracia é o pior dos regimes políticos ... bem, excetuando-se todos os outros”.

Cascaes
31.12.2009

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